segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Sobre Jornais e bicheiros

(Esta postagem dá continuidade ao assunto da postagem abaixo)
Na imprensa escrita, foi bastante curiosa a forma como os dois principais jornais se portaram diante do fechamento da empresa Paratodos. O Diário do Nordeste publicou apenas uma matéria, sendo o mais superficial possível e omitindo a lista dos sócios da banca presos pela PF. Somente dois dias depois, o jornal publicou a lista dos presos, que incluía, além de João Mendonça e Francisco Mororó, outro conhecido nome do “high society” e das páginas policiais: Fábio Leite, notório proprietário de cassinos clandestinos (nem tão clandestinos assim) e que fazia questão de expor sua ação de não acatar decisões judiciais. Também vale lembrar que Mororó chegou a ser dono da extinta TV Com, até que vendeu a emissora para o Sistema Verdes Mares de Comunicação, sendo hoje a TV Diário.

Aliás, sobre a forma como a imprensa mantém-se (ou mantinha-se) calada frente à contravenção, escreveu o ombudsman do jornal O Povo, em sua coluna do dia 12/10/08:

“MAIS ANTIGO Foi dito na matéria ‘Vou mudar a cúpula da Polícia Civil (entrevista com o secretário Francisco Crisóstomo) que ‘era notório que o Jogo do Bicho funcionava sem parar havia pelo menos três décadas em Fortaleza, mas nunca havia sido importunado’. Ocorre que apenas o ‘banco’ Para Todos funcionava sem parar havia pelo menos três décadas. O Jogo do Bicho é muito mais antigo. Quando repórter de Cidade, tentei fazer, no final da década de 70 ou início dos anos 80, uma matéria sobre o jogo do bicho, ouvindo o Sr. Francisco Mororó. Na época, nada saía na imprensa sobre jogo do bicho. Nem contra nem a favor. Os bicheiros preferiam não ser lembrados no noticiário da imprensa. Mororó ainda me fez um desafio: ‘Vamos apostar como essa matéria não sai’. Não saiu mesmo. Tentativas frustradas de fazer reportagens com o Jogo do Bicho ocorreram também com outros repórteres deste jornal”.

Sobre o texto de Paulo Verlaine, apenas o seguinte: na época nada saía na imprensa sobre o jogo do bicho e agora só saiu porque o fato não tinha como ser ignorado. O jornal O Povo fez uma ampla cobertura sobre o fato. Mas um fato chamou a atenção: o insistente enfoque sobre o “lado social” do Paratodos, através do depoimento de apontadores e apostadores. Todas as matérias traziam depoimentos sobre como a contravenção lhes garantia o sustento, direitos sociais, “seriedade” no pagamento dos prêmios, etc. Nenhuma linha sobre o universo obscuro que gravita em torno do jogo do bicho. Coincidentemente todos os textos abordavam o “trabalho social” que o Paratodos fazia.

O tráfico de drogas e a exploração sexual também “geram” emprego, renda e produzem um “trabalho social”. Nem por isso não devem ser coibidos. A argumentação de que a contravenção é aceita socialmente não tem qualquer valor, uma vez que a lei a proíbe. Assim como também proíbe o tráfico de substâncias entorpecentes, o lenocínio, o rufianismo. Em ações da Polícia na repressão a esses crimes, não se tem notícia desse tipo de enfoque por parte do jornal. Por qual motivo a simpatia à contravenção?

Além disso, publicou o seguinte: “João Carlos Mendonça - Presidente do Conselho Administrativo da Organização. As investigações apresentaram divergências entre os rendimentos declarados e a movimentação financeira. A PF detectou ainda que ele manteria bancas de jogos nas cidades de Russas, Aracati, Quixeramobim, Quixadá, Sobral, Icó, Iguatu, Crateús, Cedro e Trairi. Controla a Loteria Estadual do Ceará, Loteria dos Sonhos, Quadra da Sorte e Totolec. Os últimos empreendimentos, todavia, estão legalizados”. Os último empreendimentos não estão legalizados, amparam-se na legislação não recepcionada pela Constituição vigente. Tal qual fazia Alfonsus (Al) Capone, nenhum dos “sócios” declarava a Paratodos como fonte de renda. Na verdade nem tinham como fazê-lo. Então para onde ia o dinheiro oriundo da banca de jogo e de onde vinha o patrimônio e a renda dos sócios, que esbanjavam dinheiro abertamente? Somente no dia da execução da operação “Arca de Noé” a PF apreendeu R$ 5 milhões no cofre da Paratodos.

Nesse episódio, a resposta do secretário de segurança pública Roberto Monteiro. Dentre o fraco secretariado do governador Cid Gomes, Monteiro é o único que mantém uma postura merecedora de aplauso. O secretário não busca capitalizar mídia com o Ronda do Quarteirão – até porque o projeto foi concebido e utilizado na campanha por Cid, não por Monteiro – e tem uma postura de buscar uma assepsia no aparelho policial. Logo de cara proibiu que delegados e demais policiais obrigassem presos a concederem entrevista à imprensa, o que desagradou e não é cumprido por seus comandados. Depois teve um comportamento exemplar na crise que se abateu na Polícia Militar, através de mais um grupo de extermínio descoberto e preso.

Em recente crise com delegados da Polícia Civil, quando um grupo chegou a encaminhar documento pedindo o afastamento do delegado da PF Loredano, chefe da Coordenação de Inteligência (Coin), não aceitou a provocação da “imprensa policial” para que se debatesse e confrontasse publicamente o grupo de delegados. Teve uma postura serena e, como resposta, a ação que culminou com a prisão do segundo homem da hierarquia da Polícia Civil. Declarou que, apesar da repressão à contravenção ser da alçada estadual, não confiava nos delegados da Polícia Civil para executá-la. Loredano teve para si atraída a ira do grupo de delegados exatamente porque investigava alguns sob suspeição de envolvimento em crimes.

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